Música e poesia são tão indissociáveis como música e língua, pois todas as línguas têm também as suas próprias entoações caraterísticas – a música da língua. No grego arcaico, o verso era simultaneamente uma realidade linguística e musical: “a palavra grega tinha um corpo sonoro fixo, uma vontade musical própria” (Georgiades). Originariamente, teria havido apenas um único sistema de comunicação acústica (Rousseau), que só muito mais tarde se cindiu entre música e linguagem articulada. Re-unir sempre de novo ambas, como que no anseio de recuperar essa unidade perdida, é um traço comum a todas as culturas desde tempos imemoriais. Por isso é tão vasto, tão diverso e tão rico de invenção o repertório de poesia cantada – atravessando as épocas históricas e manifestando-se em múltiplos géneros, formas e práticas sociais. É desse valioso legado na cultura portuguesa que trata este ciclo.